segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

No Inferno por 1 Segundo - Parte I

Foto: desastresaereos.net


















Quando o Comandante Fernando Antônio Vieira, 21 anos de vôo, foi avisado por seu co-piloto da perigosa proximidade do Boeing 727-200 da VASP a "morrotes" nas cercanias de Fortaleza, era tarde demais. A gravação da caixa-preta, datada de 8 de julho de 1982 e a primeira a ser divulgada pela imprensa brasileira, terminava com um grito de dor e horror - creditado por amigos ao próprio Comandante Vieira - poucos segundos depois. O Boeing acabou por se chocar contra um enorme "morrote": a Serra da Aratanha, na região metropolitana de Fortaleza. Com Vieira, atingiram os pontos finais em suas vidas 137 passageiros e tripulantes, uma triste soma de proporções inéditas até então, e que só viria a ser superada com a queda de um avião da Gol no interior do Brasil, em 2006. O 727-200, vôo 168, havia partido do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com 59 passageiros e 9 tripulantes. Na escala carioca, pouco depois, embarcaram outros 69. O insólito do acidente reside até hoje no mistério que cerca as suas causas, que nunca foram inteiramente esclarecidas. A mais aceita nos meios aeronáuticos dá conta de que o Comandante Vieira - em um erro primário - desconsiderou a baixa altitude em que a aeronave se encontrava, fazendo com que ela entrasse na rota e posteriormente colidisse com a Serra da Aratanha. Explica-se: O primeiro alerta de descida pôde ser ouvido a 5.800 pés, aproximadamente 1.900 metros de altura. Em seguida, o Boeing já se encontrava a apenas 2.300 pés, 767 metros do chão. Foi o último alerta antes do derradeiro, a 1.500 pés, 500 metros, Serra da Aratanha. Em um procedimento correto, a aeronave só estaria a esta altitude quanto atingisse o perímetro urbano de Fortaleza, 30 quilômetros a frente. Para a História, o piloto foi sentenciado. Autorizado a descer até o nível mínimo de segurança, 5.000 pés, ele ignorou a determinação. O choque ocorreu a 530 quilômetros por hora, sem que houvesse qualquer chance para uma manobra de última hora.

Uma Busca Bizarra

Não demorou para que os primeiros moradores de Pacatuba, uma região muito pobre até hoje e miserável naqueles tempos, chegassem ao local do acidente. Assim como acontecera em Santa Catarina, em acidente com um vôo da Transbrasil poucos anos antes, os moradores locais aproveitaram a situação para promover uma busca bizarra. Restos de corpos, que explodiram em pequenos pedaços assim como a aeronave, que acompanhavam anéis, alianças e brincos de valor eram carregados em sacolas e "colocados no prego" no mercado paralelo fortalezense. O resgate demorou para chegar à região, de difícil acesso, e quando o fêz, os saques já haviam sido realizados em sua grande parte. Obviamente, os bombeiros-médicos pouco tiveram o que fazer. Os únicos atendimentos realizados trataram curiosos, que na ânsia de chegarem ao local do acidente para presenciarem o cenário macabro, se feriram com restos do avião que ainda fumegavam pelo chão. Os ataques aos restos de bagagens e demais pertences dos finados passageiros continuaram, ainda que em menor escala, por um bom tempo. Ossos de anelares, com seus respectivos anéis, eram expostos em feiras populares cearenses até dois anos após a tragédia. O ocaso do vôo 168 não só pôs fim a centenas de vidas de forma brutal, como também serviu para escarnecer a mesquinhez a que miséria e fome levam o homem.